A importância do sono na recuperação da dependência química

A importância do sono na recuperação

"Durante as crises de abstinência, o que eu mais sentia não era só a falta da droga... era o desespero de não conseguir dormir. Passava noites em claro, com a mente acelerada e o corpo exausto. Só fui entender o quanto o sono era vital quando comecei a me recuperar de verdade."

— Renato S., ex-usuário de crack em tratamento.

1. O sono como batalha silenciosa

No percurso de abstinência, o sono se torna um dos maiores desafios — muitas vezes mais difícil que a própria abstinência física da droga. Quando a mente não descansa, a exaustão se aprofunda e a resistência emocional enfraquece. O risco de recaída cresce à medida que o corpo e a mente pedem descanso — e encontram apenas angústia.

2. Quando o corpo para, mas a mente não

Depois de tanto tempo usando, o cérebro entra numa espécie de curto-circuito quando a droga sai do sistema. Isso acontece porque substâncias como álcool, cocaína, maconha e benzodiazepínicos mexem profundamente nos neurotransmissores. Dopamina, serotonina, GABA... tudo isso que regula nosso humor, nossa ansiedade, nossa capacidade de relaxar, fica completamente fora do eixo.

E aí, quando a gente decide parar, vem a conta: insônia, ansiedade noturna, pesadelos vívidos, despertares frequentes, e aquela sensação horrível de deitar e não conseguir desligar o pensamento.

Tem quem ache que é frescura. Não é.

A própria SAMHSA (Substance Abuse and Mental Health Services Administration, dos EUA) publica um guia intitulado Treating Sleep Problems of People in Recovery from Substance Use Disorders. Nesse documento, ela explica que distúrbios do sono são muito comuns durante a recuperação, podendo durar semanas ou até meses após a interrupção do uso e aumentando significativamente o risco de recaída. Veja o documento.

3. O cansaço vira gatilho

Privação de sono diminui a tolerância emocional, potencializando pensamentos de recaída. Segundo a Verywell Mind, a insônia provocada pela abstinência é um dos maiores gatilhos para o retorno ao uso de drogas, especialmente nos primeiros meses de sobriedade.

4. E a família? Também não dorme.

Quem passa por esse processo de perto — mãe, pai, companheiro ou companheira — sabe bem o que é perder noites junto com a pessoa em recuperação. A gente não fala muito sobre isso, mas a verdade é que o sono da família também vai embora.

Cuidar de alguém nesse estado é esgotante. E quando o cuidador também está exausto, todo o sistema de apoio fica fragilizado. Isso também precisa ser tratado.

5. O que o sono realmente faz pelo corpo?

Durante o sono, o corpo:

  • Restaura funções cognitivas;
  • Consolida memórias (como as da terapia);
  • Regula o humor e a resposta ao estresse;
  • Fortalece o sistema imunológico;
  • Refaz as conexões entre os neurônios.

Em recuperação, isso significa restaurar a base vital para seguir em frente com mais clareza e equilíbrio.

6. Caminhos reais para dormir melhor

Sim, é possível reensinar o corpo a dormir — mas isso leva tempo. Abaixo estão estratégias seguras e validadas cientificamente:

1. Rotina de sono

Dormir e acordar sempre no mesmo horário regula o relógio biológico. Evitar cochilos longos durante o dia ajuda a manter a consistência.

2. Desligar a luz azul

Celular, TV e computador emitem luz azul, que atrapalha a produção de melatonina. Desconectar pelo menos 1 hora antes de dormir faz diferença.

3. Reduzir cafeína, nicotina e açúcar

Essas substâncias mantêm o sistema nervoso em alerta e podem sabotar o sono, mesmo em pequenas quantidades.

4. Exercícios físicos leves

Não precisa academia. Uma caminhada de 30 minutos já ajuda. Movimento físico regular favorece o sono natural e reduz sintomas emocionais. Estudos confirmam esses efeitos positivos na recuperação de dependentes. Veja o estudo.

5. Técnicas de relaxamento

Respiração profunda, meditação e aromaterapia ajudam a desacelerar o corpo e acalmar a mente antes de dormir.

6. TCC-I (Terapia Cognitivo-Comportamental para Insônia)

A TCC-I é o tratamento mais eficaz para insônia crônica. Tem alta taxa de sucesso e não exige medicamentos. Veja artigo na PubMed.

7. Medicamentos? Só com cuidado

Quando necessário, o uso de medicamentos deve ser supervisionado por médico. O risco de dependência secundária é real.

7. Dormir não é luxo. É sobrevivência.

Uma noite bem dormida pode ser o que separa uma recaída de mais um dia de sobriedade. O sono fortalece a lucidez, regula emoções e restaura a esperança.

"Quando consegui dormir oito horas pela primeira vez, depois de quase um mês acordado, eu chorei. Chorei de alívio. De gratidão. Parecia que minha alma tinha descansado também."
— trecho compartilhado em reunião de grupo.

8. Conclusão

A recuperação não acontece só nas reuniões, na terapia ou na força de vontade. Ela também acontece à noite, no travesseiro, quando o corpo finalmente se permite descansar.

Se você está nesse caminho, ou conhece alguém que esteja, cuide do sono. É uma das bases da cura. Dormir é mais do que repousar: é sobreviver.


Referências científicas

Aviso: "Este artigo foi escrito com base em informações atuais e pode não refletir mudanças posteriores. Consulte fontes adicionais para confirmar a precisão."

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